Psicanálise e Cinema: Cisne Negro – o colapso do Eu

Cisne Negro: O Colapso do Eu e o Espelho das Máscaras – No espelho partido do filme Cisne Negro, vislumbramos mais do que a queda de uma bailarina: encontramos o retrato inquietante de uma subjetividade em ruínas, onde o desejo, o corpo e o olhar do outro se entrelaçam numa dança trágica. Ao som do balé clássico, mas guiada por pulsões inconscientes, Nina revela o drama silencioso de tantas mulheres: sustentar a perfeição enquanto se esconde o abismo. Este artigo propõe uma leitura psicanalítica da obra, articulando-a com os encontros do Grupo de Terapia, onde o eu também dança entre máscaras, delírios e a busca por um lugar simbólico no mundo.

Sinopse do Filme Cisne Negro

Cisne Negro (Black Swan, 2010), dirigido por Darren Aronofsky, narra a trajetória de Nina Sayers, uma bailarina obcecada pela perfeição, que conquista o papel principal em uma montagem de O Lago dos Cisnes. Exigida a interpretar tanto o Cisne Branco (pureza, leveza) quanto o Cisne Negro (sedução, instinto), Nina mergulha em um processo psíquico de desintegração. Pressionada pela mãe controladora, pelo diretor manipulador e por suas próprias fantasias persecutórias, ela se vê às voltas com delírios, alucinações e uma progressiva cisão do ego. Entre o real e o imaginário, Nina encarna a metáfora daquilo que Freud formulou como a não-unidade do eu.

Uma Leitura Psicanalítica: Máscaras, Superego e Pulsão

Na escuta freudiana, o eu é sempre uma construção frágil: “não é senhor em sua própria casa”. No filme, essa fragilidade é radicalizada. Nina representa o sujeito que, ao tentar sustentar uma imagem ideal — a bailarina perfeita, a filha obediente, a mulher contida —, apaga os aspectos pulsionais, inconscientes e contraditórios que a habitam. A estética do balé funciona aqui como sintoma: por trás da harmonia coreografada, há angústia, rigidez e censura.

O superego de Nina, cruel e onipresente, é encarnado pela mãe: figura fusional, infantilizadora, que a impede de crescer psíquica e simbolicamente. Em nome da “proteção”, essa mãe recalca, interdita e molda. Assim, Nina se vê condenada à repetição de uma infância não elaborada, onde o desejo é interditado pela idealização.

O “Cisne Negro” que emerge no decorrer da narrativa é, por sua vez, a personificação daquilo que estava recalcado: desejo sexual, agressividade, erotismo, rivalidade. Ao não conseguir simbolizar esses conteúdos, Nina os vive de forma alucinatória. É aí que a clínica do filme se revela: o delírio é a tentativa última do psiquismo de manter alguma coesão quando o simbólico falha. Freud nos ensina que a psicose não é ausência de sentido, mas excesso de sentido colado ao real, sem mediação.

Conexão com a Terapia em Grupo: O Espelho das Outras

Psicanálise e Cinema Cisne Negro: Nina poderia ser qualquer mulher que entra no espaço do grupo terapêutico: dividida entre o que esperam dela e o que ela ainda não ousou desejar. Em nossos encontros, escutamos esse conflito entre o “eu que performa” e o “eu que sente”. A metáfora do espelho — tão presente no filme — se materializa no grupo: no olhar da outra, na fala que toca, na cena que se repete.

O filme dialoga especialmente com os primeiros encontros do grupo, como Quem Sou Eu Hoje? – O Eu e Suas Máscaras, onde investigamos as narrativas identitárias sustentadas para sobreviver. Também encontra ressonância com O Cuidar de Si, ao mostrar como o autocuidado pode se tornar uma forma de punição; e com Desejo e Realidade, ao evidenciar o abismo entre o que Nina deseja e o que sua realidade permite viver.

Ao final do filme, o grito de “Perfeita! Eu fui perfeita!” é menos triunfo do que delírio. Não se trata de conquista, mas de um colapso psíquico diante da impossibilidade de sustentar a dissociação entre os eus. Para nós, na clínica, esse colapso é um aviso: onde não há espaço para a escuta, o sintoma fala mais alto.

Questões para o Grupo Após o Filme – Psicanálise e Cinema Cisne Negro

  1. Em quais momentos da minha vida eu senti que precisava sustentar uma máscara?

  2. Que partes de mim rejeito por não se encaixarem naquilo que esperam de mim?

  3. Como o medo de “fracassar” me impede de me reconhecer como sou?

  4. O que vejo nas outras mulheres do grupo que me provoca identificação ou distanciamento?

  5. Posso dar lugar ao meu “Cisne Negro” sem que isso me destrua?

Essas perguntas não buscam respostas prontas: elas convocam o inconsciente. Permitem que o grupo funcione como palco simbólico onde as personagens internas possam finalmente falar, cair, dançar… sobreviver.

Considerações – Psicanálise e Cinema: Cisne Negro

O filme Cisne Negro revela com intensidade a complexidade do eu, atravessado por demandas externas e desejos recalcados. Ao explorar a fragmentação psíquica da protagonista, ele oferece um espelho simbólico para a escuta clínica da psicanálise freudiana, especialmente nos espaços de terapia em grupo. Assistir a esse filme não é apenas um exercício estético: é um convite à elaboração psíquica. Afinal, como nos lembra Freud, “onde estava o id, deve advir o eu” — mas só se o eu tiver onde pousar.

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por Leonid R. Bózio
Brasília,  de 2025 anno Domini

1 comentário em “Psicanálise e Cinema: Cisne Negro – o colapso do Eu”

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