A interpretação dos Sonhos, Capítulo 4: A distorção nos sonhos

A Distorção nos Sonhos: Um Olhar Freudiano: No Capítulo IV de A Interpretação dos Sonhos, Freud explora um conceito central para sua teoria dos sonhos: a distorção. Ele começa com a ideia de que todos os sonhos são realizações de desejos, uma tese que enfrenta resistência, especialmente quando pensamos em sonhos angustiantes, como os de ansiedade. Críticos afirmam que tais sonhos não podem ser realizações de desejos, dada sua natureza dolorosa. No entanto, Freud rebate que sua teoria não se baseia no conteúdo manifesto dos sonhos, ou seja, naquilo que é lembrado ao acordar, mas nos pensamentos latentes — os desejos inconscientes que são revelados por meio da interpretação psicanalítica.

O Que é a Distorção nos Sonhos?

A distorção nos sonhos é um processo pelo qual os desejos inconscientes são mascarados no conteúdo manifesto. Isso significa que o que aparece no sonho, à primeira vista, muitas vezes não é uma representação direta dos desejos do sonhador, mas uma versão disfarçada, adaptada para escapar da censura do inconsciente. Freud argumenta que certos pensamentos, por serem perturbadores ou moralmente inaceitáveis, são censurados e transformados para que possam ser expressos de forma mais segura durante o sono.

Um exemplo clássico que Freud usa para ilustrar esse fenômeno é o sonho da injeção de Irma. À primeira vista, o sonho parece não estar relacionado ao desejo consciente de Freud, mas, após uma análise detalhada, ele revela um desejo inconsciente mascarado pela complexidade do conteúdo manifesto. Assim, o sonho se torna uma expressão distorcida de algo que, em sua forma crua, não seria facilmente aceito pela mente consciente do sonhador.

A Função da Distorção: Proteção Psíquica

Freud sugere que a distorção nos sonhos tem uma função protetora. Ela serve para preservar o sono ao impedir que o sonhador entre em contato direto com conteúdos inconscientes perturbadores. Ao distorcer esses conteúdos, o sonho evita que o sonhador seja confrontado com seus desejos reprimidos de forma abrupta, mantendo a tranquilidade do sono.

Freud compara a distorção nos sonhos à censura social, onde pensamentos inaceitáveis são modificados para se adequar a normas e convenções. Da mesma forma, no mundo dos sonhos, a censura psíquica modifica desejos reprimidos, permitindo que eles se expressem de maneira menos perturbadora.

A Interpretação dos Sonhos: Análise de Exemplos

Freud ilustra seu ponto com exemplos de sonhos aparentemente triviais, mas que, após uma análise mais profunda, revelam desejos inconscientes. Um exemplo notável é o caso de uma paciente que sonhou com uma refeição composta de salmão defumado e caviar. Esse sonho, aparentemente comum, foi interpretado por Freud como uma expressão do desejo reprimido da paciente de não ajudar uma amiga a ganhar peso. A paciente estava, inconscientemente, com ciúmes da admiração que seu marido sentia por essa amiga, e o sonho refletia esse conflito emocional.

Outro conceito que Freud introduz é o da “identificação histérica”, em que o sonhador se projeta no lugar de outra pessoa em um sonho, como forma de expressar seus próprios desejos. Essa projeção pode ocorrer não apenas em sonhos, mas também em sintomas conscientes, como os comportamentos histéricos que Freud estudou.

Conclusão: A Distorção como Chave para o Inconsciente

Freud conclui que, mesmo em sonhos que parecem contradizer sua teoria, como os sonhos angustiantes ou de ansiedade, o desejo inconsciente está presente, ainda que disfarçado. Esses sonhos, quando interpretados corretamente, revelam a complexa dinâmica entre os desejos reprimidos e os mecanismos de censura e repressão que moldam o conteúdo manifesto dos sonhos. O desprazer que o sonhador sente, em última análise, é uma consequência da repressão, e até mesmo esses sonhos angustiantes podem ser vistos como realizações distorcidas de desejos inconscientes.

Assim, o processo de distorção onírica não apenas protege o sonhador de seus próprios desejos reprimidos, mas também oferece uma rica via para a exploração psicanalítica dos desejos ocultos, tornando os sonhos um campo fértil para a compreensão do inconsciente.

Freud (1900) – Obras completas volume 4: A interpretação dos sonhos por Sigmund Freud (Autor)

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por Leonid R. Bózio
Brasília,  outono de 2024 anno Domini

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