Interpretação de Sonhos com IA 010 – A Menina Perdida em Mim: Psicanálise e a Interpretação de Sonhos que Doem, Berta P é o pseudônimo de uma leitora do blog, garantindo total privacidade à sua identidade. Se você deseja que eu analise seu sonho com o auxílio da IA, entre em contato! Para uma melhor compreensão deste artigo, recomendo a leitura de: Como a Inteligência Artificial ajuda na Interpretação dos Sonhos?
Na psicanálise freudiana, os sonhos são a via régia para o inconsciente. Através deles, escutamos o que se cala na vigília: desejos recalcados, conflitos afetivos e traços da história psíquica que insistem em se repetir. A escuta analítica dos sonhos, por isso, é um ato clínico e um gesto de escuta profunda do ser.
A seguir, compartilhamos um relato onírico de Berta P., que tem aparecido com frequência em suas sessões:
O Sonho de Berta P.
“Acordei quebrada hoje (fisicamente mesmo). Tive sonhos terríveis e já velhos conhecidos meus.
Estou sempre sozinha e perdida, literalmente procurando minha casa. Vejo caminhos que parecem me levar até lá.
Depois ando exaustivamente, mas quando chego, não é minha casa.
Vejo meus pais e mais pessoas. Muitas vezes é noite escura. Grito, mas ninguém me ouve!
Perco os chinelos no caminho, fico com fome, fraca, com sede.
Devo ser bem pequena, porque vejo meus irmãos todos crianças, depois são minhas filhas.
Acordo como se um caminhão tivesse passado por cima de mim. Sinto-me literalmente despedaçada.
Por isso já mandei essa porcaria, pelo menos não vai ser 5k que vou pagar.
Fui colocando literalmente os valores até dar um valor que possa pagar.
Uma hora deu que eu iria receber 192.928,00 — até sorri com meu devaneio.”
Análise Psicanalítica do Sonho
O sonho recorrente de Berta P. oferece uma imagem clara de angústia e desamparo. Na linguagem dos sonhos, a casa representa o Eu, o corpo, o pertencimento psíquico. Estar “sempre sozinha e perdida, procurando a casa” sugere um conflito profundo relacionado à identidade e ao lugar de afeto e proteção. O lar, que deveria ser espaço de acolhimento, torna-se inalcançável ou ilusório: o caminho nunca a leva à sua casa verdadeira.
O elemento “noite escura” e o grito que ninguém ouve apontam para uma sensação primária de desamparo, uma marca de experiências onde a necessidade emocional não foi escutada ou acolhida. A presença dos pais no sonho é ambígua: aparecem, mas não acolhem — o grito permanece sem resposta. Há aqui uma possível revivência de situações infantis de exclusão ou negligência emocional.
Outro dado importante: “perco os chinelos, fico com fome, fraca, com sede”. O corpo da sonhadora se expressa em estado de vulnerabilidade. A perda dos chinelos — símbolo da jornada, da dignidade, da proteção mínima — reforça a ideia de estar “descalça” no mundo, sem recursos, sem sustento. A fome e sede no sonho não são apenas físicas: são metáforas da carência afetiva, do desejo de nutrição emocional e sentido.
A sequência em que os irmãos aparecem como crianças e depois se tornam suas filhas sugere uma regressão temporal. O inconsciente mistura as gerações, revelando um campo simbólico de repetição: o que foi vivido na infância, possivelmente de forma traumática, retorna no exercício materno. Como se a história se repetisse com os filhos, agora não mais como filha, mas como mãe. A confusão entre os papéis familiares pode apontar para uma história emocional emaranhada, sem bordas claras.
Por fim, o trecho final — fantasiar um valor a ser recebido, como forma de alívio ou compensação — é revelador. Após o “caminhão” emocional do sonho, surge um momento de devaneio reparador, em que um valor absurdo (quase 200 mil reais) aparece como se fosse um pagamento simbólico pela dor vivida. Esse movimento é um claro mecanismo de defesa do ego: o humor, o devaneio, o cálculo, emergem como tentativa de lidar com a dor psíquica que parece não caber na linguagem cotidiana.
Uma Leitura Freudiana
Freud, em A Interpretação dos Sonhos (1900), afirma que “os sonhos são realizações de desejos”. O desejo que emerge no sonho de Berta P. parece ser o desejo de pertencer, de ser cuidada, de encontrar um lugar que possa chamar de seu — desejo profundamente humano, mas que retorna sob a forma de angústia, pois se liga a vivências de frustração. O sonho não realiza o desejo conscientemente; ao contrário, revela o modo como ele se encontra reprimido, interditado ou ferido.
Considerações
Este é um exemplo claro de como os sonhos nos falam de nós, mesmo quando parecem apenas nos confundir ou esgotar. O corpo despedaçado ao acordar revela que o que foi sonhado não é apenas simbólico — é vivido. Na psicanálise, oferecemos escuta e tempo para que esses fragmentos reencontrem o caminho da casa interior. A Interpretação de Sonhos é mais do que decifrar símbolos: é dar sentido ao que se repete no silêncio.
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por Leonid R. Bózio
Brasília, de 2025 anno Domini
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